O papa lançou nesta quarta-feira (10) um novo tuíte em nove línguas em sua conta @Pontifex: “Rezemos pelos enfermos que são esquecidos e abandonados à morte. Uma sociedade é humana se protege a vida, toda a vida, do início a seu fim natural, sem escolher quem é digno ou não para viver. Que os médicos sirvam à vida, não a tirem”.
Esse novo tuíte de Francisco é publicado ao tempo em que Vincent Lambert está morrendo de fome e de sede. O enfermeiro francês de 42 anos, em estado vegetativo ou de consciência mínima após um acidente rodoviário em 2008, encontra-se internado no hospital universitário de Reims.
No último dia 2 de julho os profissionais de saúde do hospital suspenderam novamente a alimentação e a hidratação após uma longa batalha legal que assumiu dimensões internacionais.
Paris não acolhe pedido da ONU
A França decidiu não levar em consideração o apelo do Comitê das Nações Unidas para os direitos das pessoas necessitadas de cuidados especiais, que tinha solicitado seis meses para examinar o caso.
A Convenção da ONU para os direitos dos necessitados de cuidados especiais – que foi ratificada por Paris, mas para o governo francês “não é vinculadora” – afirma no artigo 25 a necessidade de “tomar todas as medidas apropriadas para assegurar às pessoas com deficiência o acesso aos serviços de saúde (…) incluídos os serviços de reabilitação” e a “impedir a rejeição discriminatória de assistência médica ou de cuidados e serviços de saúde ou de alimentos e fluídos baseada na incapacidade”.
Os pais de Vincent acusam: “estão matando uma pessoa necessitada de cuidados especiais que não está em fim de vida, é eutanásia”. A eutanásia é proibida na França. A dor do pai e da mãe, que assistem à morte programada do filho, tornou-se ainda mais aguda com as críticas, se não insultos, de certos setores que desqualificam o calvário deles definindo-os “católicos integristas”.
Não ceder à cultura do descarte
Já em 20 de maio passado, quando os médicos tinham começado a interromper a alimentação e hidratação, depois retomadas após a sentença da Corte de Apelo, o Papa havia lançado o seguinte tuíte: Rezemos por aqueles que vivem em estado de grave enfermidade. Protejamos sempre a vida, dom de Deus, do início até o fim natural. Não nos resignemos à cultura do descarte.
No ano passado Francisco lançara dois apelos públicos em favor de Vincent Lambert, citando o nome dele de modo explícito, caso raro para os apelos pontifícios deste tipo. O papa tinha pensado neste caso, aproximando-o à história do pequeno Alfie Evans. Em 15 de abril de 2018, por ocasião do Regina Caeli, dissera:
“Confio à oração de vocês as pessoas, como Vincent Lambert, na França, o pequeno Alfie Evans, na Inglaterra, e outras em várias partes do mundo, que vivem, às vezes por longo tempo, em estado de grave enfermidade, assistidas de forma médica para as necessidades primárias. São situações delicadas, muito dolorosas e complexas. Rezemos a fim de que todo enfermo seja sempre respeitado em sua dignidade e receba os cuidados de modo adequado à sua condição, com a contribuição concorde dos familiares, dos médicos e dos outros agentes de saúde, com grande respeito pela vida.”
Deus é o único dono da vida
Três dias depois, ao término da audiência geral de 18 de abril de 2018, Francisco fez um novo apelo:
“Chamo a atenção novamente sobre Vincent Lambert e sobre o pequeno Alfie Evans, e gostaria de reiterar e fortemente confirmar que o único dono da vida, do início até o fim natural, é Deus! E nosso dever, nosso dever é fazer de tudo para tutelar a vida.”
O papa Francisco, na esteira de seus predecessores, sempre teve palavras claras sobre o respeito pela vida, em todos os seus sentidos. Em 5 de junho passado, dirigindo o pensamento e a oração a Noa Pothoven, a jovem de 17 anos holandesa que escolheu morrer acompanhada por médicos especializados em suicídio assistido, afirmara em outro tuíte:
“A eutanásia e o suicídio assistido são uma derrota para todos. A resposta à qual somos chamados é jamais abandonar quem sofre, não resignar-se, mas cuidar e amar para dar novamente a esperança.”
Santa Sé: alimentar e hidratar enfermo é dever irrenunciável
Por fim, recordamos também o comunicado conjunto sobre o caso, feito pelo prefeito do Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, cardeal Kevin Farrell, e pelo presidente da Pontifícia Academia para a Vida, dom Vincenzo Paglia, no qual reiteraram que “a interrupção da alimentação e da hidratação comporta grave violação da dignidade da pessoa”, contestando a decisão dos médicos de Reims que definiram “insensata obstinação” manter Vincent em vida:
Efetivamente, o ‘estado vegetativo é estado patológico certamente gravoso, que todavia não compromete de modo algum a dignidade das pessoas que se encontram nesta condição, nem seus direitos fundamentais à vida e aos cuidados, entendidos como continuidade da assistência humana de base. A alimentação e hidratação constituem uma forma de cuidado essencial sempre proporcionada à conservação da vida: alimentar um enfermo jamais constitui uma forma de insensata obstinação terapêutica, enquanto o organismo da pessoa é capaz de absorver alimentação e hidratação, a não ser que provoque sofrimentos intoleráveis ou resultados danosos para o paciente. A suspensão de tais cuidados representa, ao invés, uma forma de abandono do enfermo, fundado num juízo impiedoso sobre a qualidade de sua vida, expressão de uma cultura do descarte que seleciona as pessoas mais frágeis e indefesas, sem reconhecer sua unicidade e imenso valor. A continuidade da assistência é um dever irrenunciável.