Por dom Genival Saraiva de França*
Sob muitos aspectos, pessoas, grupos, instituições, nações, conforme a realidade do tempo e do lugar, conhecem mudanças “para melhor ou para pior”. Na verdade, tudo que é terrestre, que é humano está sujeito a toda ordem de vicissitudes, isto é, a “uma sequência de transformações ou mudanças”, “os acasos que acontecem cotidianamente, ‘os altos e baixos da vida’”. Dado que isso acontece na rotina da vida, todos falam disso “com conhecimento de causa”.
A vida, em si, é dinâmica; por consequência, a mudança faz parte da sua natureza. Todavia, a mudança “para melhor ou para pior” não é obra do acaso. À luz da Revelação de Deus e com o olhar da ciência, qualquer pessoa, com menor ou maior ordem de conhecimento, pode compreender que as coisas não acontecem por ocaso; por certo, grande parte das pessoas não consegue estabelecer a relação “entre causa e efeito” nas coisas mais simples e naquelas mais complexas. Mas, é assim que acontece.
A respeito de coisas dessa natureza, ensinava o Rei Salomão: “‘Vaidade das vaidades, diz o Eclesiastes, vaidade das vaidades, tudo é vaidade!’” Que proveito tira o ser humano de todo o trabalho com o qual se afadiga debaixo do sol? Uma geração passa, outra vem, e a terra continua sempre a mesma. O sol se levanta, o sol se põe e se apressa para voltar a seu lugar, onde renasce. O vento gira para o sul e dobra para o norte; passando ao redor de todas as coisas, ele prossegue e volta aos seus rodeios. Todos os rios correm para o mar, e o mar contudo não transborda; para o lugar de onde saíram voltam os rios no seu percurso. Todas as coisas são difíceis e não se pode explicá-las com palavras. A vista não se cansa de ver, nem o ouvido se farta de ouvir. O que foi, é isto mesmo que vai ser feito: não há nada de novo debaixo do sol.” (Ecl 1,1-10)
Essa palavra de Salomão “não há nada de novo debaixo do sol” se refere a fenômenos da natureza ou do comportamento humano, onde ocorrem mudança, continuidade, regularidade. Todos percebem as mudanças na natureza porque estão diante dos olhos e suas consequências são sentidas no dia a dia; tome-se como exemplo o fenômeno das chuvas: a regularidade de tempos passados cedeu lugar à falta ou ao excesso do presente.
Em termos de comportamento humano, da mesma forma, identificam-se mudanças “para melhor ou para pior”. Nada mais lógico, uma vez que o ser humano não é regido por puro automatismo, uma vez que age “por vontade própria”; há automatismo no ser humano, como o “automatismo cardíaco” e outros. Não é o caso do comportamento humano.
Além do comportamento individual, também o comportamento social conhece, experimenta mudanças “para melhor ou para pior”. Salomão enxergou essa situação, no universo da natureza e do comportamento humano: “Todas as coisas são difíceis e não se pode explicá-las com palavras.”
Obviamente, algumas coisas, no plano da natureza, graças ao desenvolvimento da ciência, já têm a devida explicação. Embora haja a fundamentada explicação científica, o povo continua dizendo o que dizia Salomão: “O sol se levanta, o sol se põe e se apressa para voltar a seu lugar, onde renasce.” Da mesma maneira, no mundo do comportamento humano, “as coisas são difíceis”, em se tratando de personalidade individual ou de coletividade. De qualquer forma, o indivíduo está compreendido na coletividade e os traços de sua personalidade se manifestam, continuamente.
Considere-se o contexto da realidade brasileira, nessa leitura das coisas difíceis. Os tempos são difíceis e estão cada vez mais difíceis para todos. Há muitas pessoas que os vivem, sem compreender o seu alcance, como as crianças que sofrem pesadas consequências: quantas tornaram-se vítimas fatais de “balas perdidas” ou em muitos casos, encontram-se sem a liberdade de “ir e vir”; a escola deixou de ser lugar de segurança.
Os que têm consciência dessa realidade, como os adultos, sabem que, em matéria de violência social, os tempos estão cada vez mais difíceis nas cidades, de grande, médio e pequeno porte, e no meio rural, onde a tranquilidade já não é um registro comum. Na expectativa de mais segurança, muitas famílias se mudam para as cidades. Via de regra, indo para periferias desassistidas, tornam-se vítimas potenciais ou reais da violência cotidiana.
No mundo do trabalho, os tempos estão extremamente difíceis para os milhões de brasileiros desempregados, por terem perdido o emprego ou porque nunca se incorporaram ao mercado de trabalho. Não é preciso ser um analista econômico qualificado para avaliar o que isso significa. Quem se encontra na condição de desempregado, independentemente da idade, do grau de escolaridade e do nível social, carrega o peso da dificuldade de sua manutenção no presente e a angústia da incerteza do amanhã.
A falta de horizontes, por parte das pessoas, e a perda de credibilidade nos agentes públicos, por parte da sociedade, tornam os tempos ainda mais difíceis para todos. Contudo, o olhar cristão sobre a realidade aponta caminhos a serem percorridos, de forma democrática, mediante uma criteriosa participação da população brasileira que deve confiar na capacidade de mudança das pessoas e das estruturas.
*Bispo emérito da Diocese de Palmares (PE)