Dom Genival Saraiva de França
Bispo emérito da Diocese de Palmares (PE)
Ao celebrar o Tempo da Quaresma, a Igreja o considera “tempo favorável” para a prática da penitência, “tempo aceitável” para a conversão do “coração penitente”. Essa é a linguagem da oração da Igreja, desde os primórdios da Liturgia quaresmal – conversão, penitência, jejum, esmola, oração. Como as pessoas vivem sua condição cristã “no tempo e no espaço”, há de se entender que, em cada situação e contexto, a vivência deste “tempo de graça”, contando com auxílios especiais de Deus, contém apelos explícitos na direção da mudança de sentimentos e atitudes que signifiquem uma verdadeira conversão individual e comunitária. Assim, como sempre fizeram, os fiéis vivem a Quaresma com o olhar e o coração voltados para Deus e para os seus semelhantes. Sabem, porém, que, em 2021, por muitas razões, a experiência dolorosa da pandemia imprime à sua participação nas celebrações quaresmais e pascais um “formato” próprio, como rito e como forma de vivê-las. Tudo isso, obviamente, tem a expressão do sofrimento, vivido pelo povo, de muitas maneiras. Considere-se a forma de participação, neste ano, à luz do que prescrevem os Mandamentos da Igreja Católica: “1º – Participar da missa inteira nos domingos e outras festas de guarda. 2º – Confessar-se ao menos uma vez por ano. 3º – Comungar ao menos pela Páscoa da ressurreição. 4º – Jejuar e abster-se de carne, conforme manda a Santa Mãe Igreja. 5º – Ajudar a Igreja em suas necessidades.”
Compreende-se, logo, que a forma presencial de participação está estabelecida pelas políticas públicas, em âmbito nacional, estadual e municipal, entre cujas medidas obrigatórias encontram-se algumas que limitam ou impedem a presença física das pessoas, a fim de evitar a disseminação do coronavírus. As Igrejas estão entre os espaços que são objeto de redução ou de proibição de participação das pessoas, conforme essas determinações. Por isso, as orientações de cada Diocese seguem as determinações das políticas públicas concernentes ao percentual definido de presença física. O atendimento aos fiéis, em confissão, no período quaresmal, prática vivenciada pelos fiéis, com motivada convicção penitencial, também está sujeito aos critérios do distanciamento físico e social. A comunhão eucarística dos fiéis, no Tríduo Pascal, no Domingo da Ressurreição e no tempo pascal, será visivelmente reduzida, pelas mesmas razões. A formação religiosa dos fiéis os leva a praticar o que determina o quarto Mandamento da Igreja, jejuar e abster-se de carne, como sinal de sua força de vontade, ascese de penitência e de solidariedade com milhões de pessoas que vivem o jejum e abstinência todos os dias. O quinto Mandamento é cumprido através das formas concretas, conforme as indicações habituais de sua Igreja diocesana e paroquial, como o dízimo. Uma prática da caridade social, já associada a esse tempo quaresmal, é a Coleta da Campanha da Fraternidade, no domingo de Ramos, no próximo dia 28 de março, mediante o gesto concreto de solidariedade, de caridade, no apoio a projetos de caráter social, aprovados pelo Conselho Gestor do Fundo Nacional de Solidariedade (FNS). Este gesto da CF encontra respaldo na Mensagem do Papa Francisco para a Quaresma deste ano – “Quaresma: tempo para renovar fé, esperança e caridade”: “A caridade alegra-se ao ver o outro crescer; e de igual modo sofre quando o encontra na angústia: sozinho, doente, sem abrigo, desprezado, necessitado… A caridade é o impulso do coração que nos faz sair de nós mesmos gerando o vínculo da partilha e da comunhão. ‘A partir do “amor social’, é possível avançar para uma civilização do amor a que todos nos podemos sentir chamados. Com o seu dinamismo universal, a caridade pode construir um mundo novo, porque não é um sentimento estéril, mas o modo melhor de alcançar vias eficazes de desenvolvimento para todos’ (FT, 183).”
Por ser “tempo favorável” para mudanças significativas de vida, em termos de palavras, sentimentos e atitudes das pessoas, a Quaresma é a preparação espiritual, por excelência, para a celebração da Páscoa do Senhor.