Múltiplos sotaques inundam o Seminário São José de Manaus. São as vozes dos participantes da I Experiência Vocacional Missionária Nacional que acontece na arquidiocese de Manaus, de 5 a 17 deste mês. Seminaristas diocesanos e religiosos, padres, diáconos, bispos, religiosas e membros da Juventude Missionária se prepararam para se inserir ao longo de uma semana na vida das comunidades da Amazônia.
Ao todo são 280 missionários e missionárias de 94 dioceses de todos dos 19 regionais que fazem parte da Igreja do Brasil e mais de uma dezena de congregações religiosas. Os missionários e missionárias, segundo afirmou o bispo nomeado para Parintins (AM), dom José Albuquerque de Araújo, foram acolhidos com alegria pela Igreja local. O bispo explicou que os missionários vão conhecer a existência de diferentes “Amazônias” e experiências eclesiais na região.
A experiência conta com o apoio das Pontifícias Obras Missionárias (POM Brasil), Organização dos Seminários e Institutos do Brasil (OSIB), Arquidiocese de Manaus, Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB), Pontifícia União Missionária, Conselho Missionário de Seminaristas Nacional (COMISE) e a Juventude Missionária.
Um momento importante dentro do processo de formação inicial dos futuros presbíteros, segundo o secretário nacional das POM Brasil, padre Antônio Niemec. Ele vê esta experiência como um instrumento de discernimento no processo formativo. Para o reitor do Seminário São José de Manaus, padre Zenildo Lima, trata-se de uma oportunidade de encontrar na missão o sentido verdadeiro de sua vocação. Ele diz ser importante não ver esta atividade como um parêntese, um corte na vida do seminário.
A professora Elisângela Maciel reforça que os missionários e missionárias chegam a uma Igreja nascida de um processo de evangelização onde a sua relação com os colonizadores foi mudando, passando do colaboracionismo à denúncia. Ela instigou os participantes a descobrir, lembrando as palavras do Papa Francisco, que a Igreja está aqui para servir. A professora falou da necessidade de tirar os documentos do papel, de estarem preparados para os desafios amazônicos, descobrir qual é o rosto amazônico, resolver o problema da falta de Eucaristia, superar o clericalismo e implantar a sinodalidade na Igreja.
Na história da Igreja da Amazônia, o encontro de Santarém (PA), em 1972, tem um lugar de destaque. Em 2022, a Igreja da Amazônia fez memória do processo vivido 50 anos atrás, constatando a necessidade de uma Igreja encarnada na realidade e uma evangelização libertadora, segundo dom José Ionilton Lisboa de Oliveira. Um documento que faz referência aos sonhos da Querida Amazônia, buscando construir uma Igreja com rosto amazônico, um chamado do Papa Francisco.
Realidade dos povos indígenas e missão ad gentes
Na cidade de Manaus e seu entorno se estima a presença de cerca de 40 mil indígenas de 38 povos diferentes, chegados de diferentes regiões do interior do Estado do Amazonas para morar nas periferias da grande metrópole, onde tentam manter suas culturas. Uma população que segundo o jovem indígena Eliomar Tukano chegou em Manaus por causa da violência provocada pelos exploradores, sonhando com emprego, educação. Segundo ele não cabe mais o discurso de “vou evangelizar os povos originários” uma vez que os povos têm o direito a viver a missão desde a interculturalidade.
A missão é algo que faz parte da vida do atual bispo da diocese de Cachoeiro de Itapemerim (ES), dom Luiz Fernando Lisboa. Ele foi missionário em Moçambique, na África, durante 20 anos, onde foi Bispo da diocese de Pemba. Ele defende que a missão precisa ser protagonista e eixo transversal na Igreja, demandando uma maior abordagem da Missiologia na grade da formação teológica dos seminaristas. “A missão é mãe da Teologia”, defende.
O Bispo refletiu sobre a missão na Igreja do pós-Concílio Vaticano II, destacando a importância que ela tem na atual estrutura da Igreja, recolhida na Praedicate Evangelium, que quer conferir um novo vigor à ação pastoral da Igreja e uma estrutura mais missionária à Cúria, sendo criado um dicastério que está sob a responsabilidade direta do Papa. A missão tem mudado a visão do mundo de alguém que diz ter saído da África, mas a África não tem saído dele, um lugar onde ele diz ter aprendido a escutar. Por isso, convidou os participantes da Experiência Vocacional Missionária a se colocarem a dispor da Igreja e se questionar onde Deus os quer enviar.
Os missionários percebem a I Experiência Vocacional Missionária como motivo de alegria que desperta “a expectativa de poder enriquecer o processo formativo”, segundo relata o seminarista Carlos Daniel, da diocese de Colatina (ES). Ele, que faz parte da Comissão Nacional do COMISE, destaca que “a proposta para os seminaristas que participam é encontrar o sentido verdadeiro da sua vocação, que é o que, no fundo, todos são chamados a ser: missionários”.
Acompanhando aos seminaristas da arquidiocese de Ribeirão Preto (SP), o padre Manoel diz ter chegado na Amazônia para “fazer uma experiência de reencontro, conhecer a realidade, conviver, ir a essa experiência mais profunda do Evangelho. Conhecer a experiência, conhecer o Evangelho e conhecer a realidade de cada comunidade, de cada povo”. Segundo ele, “o Evangelho é esse encontro sempre, e sobretudo fazer uma experiência até mesmo de levar para a própria comunidade essa abertura que é esse Encontro Nacional Vocacional Missionário, uma abertura que transforma e que ajuda a Igreja a ser transformada”.
Gustavo Mariotto foi enviado pelo Instituto Missionário São José e diz esperar “renovar a sua vocação, a esperança na Igreja, de dias melhores, dias de santificação pessoal, santificação também do povo de Deus, um tempo de graça, uma Igreja em saída, como nos diz nosso querido Papa Francisco”. Wal Rodrigues, representante da Juventude Missionária da arquidiocese de Manaus, diz buscar mais conhecimento nesta experiência e formar amizades, “porque a gente vai sair ao encontro do outro”. Ela quer receber a gratidão que nasce do fato de “estar junto, de sair de minha zona de conforto para estar junto com aquele a quem eu vou encontrar que o senhor mandar”.
Os missionários e missionárias foram enviados na celebração eucarística presidida pelo bispo prelado de Itacoatiara (AM), dom José Ionilton Lisboa de Oliveira. Ao longo de mais de uma semana, de 7 a 15 de janeiro, eles visitarão comunidades da periferia, indígenas, ribeirinhas na Arquidiocese de Manaus, na Diocese de Coari e na Prelazia de Itacoatiara, onde são chamados a viver a missão como um valioso e indispensável meio para a formação da mentalidade e coração missionários do seguidor de Jesus Cristo.
Fonte: CNBB com informações do padre Luiz Modino