“Nunca cansemos de gritar ‘não à guerra'”, diz Francisco em mensagem para o Encontro da Fraternidade #NotAlone

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#NotAlone, um encontro muito desejado e aguardado por Francisco, voltado a relançar o sonho da fraternidade. Impedido de participar pessoalmente devido à cirurgia a que foi submetido na última quarta-feira (7), confiou a leitura de seu discurso ao cardeal Mauro Gambetti, vigário-geral para a Cidade do Vaticano, presidente da Fábrica de São Pedro e arcipreste da Basílica.

Ao lado de artistas e Prêmios Nobel, famílias, associações, os que vivem à margem da sociedade, desde os mais pobres e sem-teto aos migrantes e vítimas da violência e do tráfico de pessoas, ouviram atentos a mensagem do Santo Padre a eles dirigida, nesta segunda-feira (12):

“Queridas irmãs e irmãos, boa tarde!

Embora não possa acolher-vos pessoalmente, quero dar-vos as boas-vindas e agradecer cordialmente por terdes vindo. É com alegria que me uno a vós para professar este desejo de fraternidade e paz em prol da vida do mundo. Um escritor colocou nos lábios de Francisco de Assis estas palavras: «O Senhor encontra-Se onde estão os teus irmãos» (E. Leclerc, A sabedoria dum pobre). Verdadeiramente o Céu que nos cobre convida-nos a caminhar juntos sobre a terra, a descobrir que somos irmãos e a acreditar na fraternidade como dinâmica fundamental do nosso peregrinar.

Na Encíclica Fratelli tutti, escrevi que a fraternidade «tem algo de positivo a oferecer à liberdade e à igualdade» (n. 103), porque quem vê um irmão, vê no outro um rosto, não um número: é sempre «alguém» que tem dignidade e merece respeito, não «algo» a ser usado, explorado ou descartado. No nosso mundo dilacerado pela violência e a guerra, não bastam meros retoques e ajustamentos; só uma grande aliança espiritual e social, que nasça dos corações e se mova ao redor da fraternidade, pode fazer voltar ao centro das relações a sacralidade e a inviolabilidade da dignidade humana.

Por isso, a fraternidade não tem necessidade de teorias, mas de gestos concretos e opções compartilhadas que a tornem cultura de paz. Assim, não devemos perguntar-nos que me podem dar a mim a sociedade e o mundo, mas que posso eu dar aos meus irmãos e irmãs. Ao regressar a casa, pensemos no gesto concreto de fraternidade que havemos de fazer: reconciliar-nos em família, com os amigos ou vizinhos, rezar por quem nos fez mal, identificar e socorrer quem passa necessidade, oferecer uma palavra de paz na escola, na universidade ou na vida social, ungir de proximidade alguém que se sinta só…

Sintamo-nos chamados a aplicar o bálsamo da ternura nas relações gangrenadas tanto entre as pessoas como entre os povos. Nunca nos cansemos de gritar «não à guerra», em nome de Deus ou em nome de todo o homem e mulher que aspiram à paz. Vêm-me à mente os versos de Giuseppe Ungaretti que, no coração da guerra, sentiu necessidade de falar dos irmãos precisamente como «palavra trémula na noite; folha acabada de nascer». A fraternidade é um bem frágil e precioso. Os irmãos são a âncora da verdade, no mar tempestuoso dos conflitos que semeiam mentira. Evocar os irmãos é lembrar a quem combate, e a todos nós, que o sentimento de fraternidade que nos une é mais forte que o ódio e a violência; mais, associa a todos na mesma dor. Aqui está o ponto donde partir sempre de novo: a consciência de se «sentir unido», centelha que pode reacender a luz para deter a noite dos conflitos.

Acreditar que o outro seja irmão, dizer «irmão» a outrem não é uma palavra vazia, mas a coisa mais concreta que cada um de nós pode fazer. Na realidade, significa emancipar-se da pobreza de se julgar no mundo como filhos únicos. Ao mesmo tempo significa optar por superar a lógica dos sócios, que permanecem juntos apenas por interesse, sabendo também ultrapassar os limites dos laços de sangue ou étnicos, que só reconhecem o semelhante e negam o diverso. Penso na parábola do Samaritano (cf. Lc 10, 25-37), que pára compassivo junto do judeu carecido de ajuda. As suas culturas eram inimigas, as suas histórias diversas, as suas regiões hostis uma à outra, mas, para aquele homem, a pessoa encontrada na estrada e a sua necessidade de ajuda estavam em primeiro lugar.

Quando os homens e as sociedades escolhem a fraternidade, muda também a política: a pessoa volta a prevalecer sobre o lucro, a casa onde todos moramos sobre o meio ambiente explorado em benefício próprio, o trabalho é pago com o justo salário, o acolhimento torna-se riqueza, a vida esperança, a justiça abre à reparação e a memória do mal feito é curada no encontro entre vítimas e malfeitores.

Queridos irmãos e irmãs, agradeço-vos por terdes organizado este encontro e terdes dado vida à «Declaração sobre a fraternidade humana», elaborada esta manhã pelos ilustres Prémios-Nobel presentes. Creio que a mesma nos ofereça «uma gramática da fraternidade» e seja um guia eficaz para a viver e testemunhar concretamente no dia a dia. Juntos, trabalhastes bem e muito vos agradeço! Façamos, daquilo que vivemos hoje, o primeiro passo de um caminho e possa iniciar um processo de fraternidade: as praças conectadas de várias cidades do mundo, que saúdo com gratidão e afeto, testemunham quer a riqueza da diversidade quer a possibilidade de ser irmãos mesmo quando não nos podemos encontrar fisicamente, como sucedeu comigo. Segui em frente!

Quero despedir-me deixando-vos uma imagem: a do abraço. Desta tarde que passamos juntos, espero que guardeis no coração e na memória o desejo de abraçar as mulheres e os homens de todo o mundo para, juntos, construirmos uma cultura de paz. Com efeito a paz precisa de fraternidade, e a fraternidade precisa de encontro. Que o abraço dado e recebido hoje, simbolizado pela Praça [de São Pedro] onde vos congregais, se torne compromisso de vida e profecia de esperança. E abraço-vos eu próprio enquanto vos renovo o meu agradecimento e de coração vos digo: estou convosco!”

Fonte: Vatican News

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