O bispo de Paranaguá (PR) e presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Liturgia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Edmar Peron, foi entrevistado dessa semana no programa Bispos do Brasil, da TV Evangelizar. Em sua participação, falou do trabalho da Comissão responsável pelos temas de liturgia na Igreja no Brasil e deu indicações sobre tensões que surgem em relação à celebração dos ritos sagrados.
Dom Edmar reforçou de se tomar o Concílio Vaticano II como referência; criticou o ritualismo raso, reforçando a necessidade de se ter sentido no que se faz na liturgia; falou da relação da celebração com o crescimento espiritual; dos exageros na liturgia; e do processo de tradução da 3ª edição do Missal Romano.
O jornalista Everton Barbosa começou conversando com dom Edmar Peron sobre a realidade da diocese de Paranaguá, no litoral paranaense. Foram recordados os desafios pastorais diante da vulnerabilidade no entorno do Porto de Paranaguá. A conversa também abordou a vocação de dom Edmar e seus estudos em Teologia Dogmática. “Na minha vida, nunca separei a celebração litúrgica da reflexão teológica dos sacramentos”, destacou o bispo.
Essa proximidade com a Teologia dos Sacramentos o fez chegar à presidência da Comissão Episcopal Pastoral para a Liturgia da CNBB, em maio de 2019, quando foi eleito na 57ª Assembleia Geral da Conferência. Dom Edmar falou sobre a estrutura da Comissão para a Liturgia, divina em três setores (Pastoral Litúrgica, o Setor Música e o Setor Espaço Sagrado), cada um com seu assessor, e composta por outros dois bispos. Também recordou o trabalho da Comissão para os Textos Litúrgicos (Cetel), a qual tem “o grave encargo de fazer a revisão da tradução da terceira edição do Missal Romano”.
A Liturgia não é de grupos
Questionado sobre grupos que querem conservar e grupos que querem avançar em relação à reforma Litúrgica do Concílio Vaticano II, dom Edmar afirmou que é necessário, num primeiro ponto, ser firme ao recordar a proposta litúrgica do Concílio Vaticano II. “Porque, se não, nós começamos a discutir com grupos de um lado ou de outros a partir de gostos pessoais”.
Para dom Edmar, um segundo ponto é resgatar, desde o Concílio Vaticano II até o Papa Francisco, qual a normativa litúrgica que surgiu, “porque nós não temos somente a Sacrossantum Concilium desde o Vaticano II até hoje. São muitas as orientações e normas dadas nesse longo período. Nós devemos olhar o que surgiu”.
Na sequência, dom Edmar exorta que é preciso considerar que a Liturgia é algo eclesial. “É da Igreja, não é de grupos. Então, não é de um movimento, não é de uma ala, mas é da Igreja. Por isso, quando se fala de renovação, de mudanças, sempre se fala da autoridade para fazer isso – um concílio, um magistério do Papa, de uma Conferência Episcopal, dos bispos”.
Dimensão do sentido diante do ritualismo raso
As ações litúrgicas, segundo dom Edmar, encontram amparo nas orientações da Igreja e precisam conter a dimensão do sentido. Esta se encontra na tradição e na Palavra de Deus.
“As pessoas vivem um ritualismo muito raso, porque elas vão sendo apenas repetidoras. Veem, acham que aquilo é interessante, repetem, repetem, repetem… Mas quando você pergunta sobre o sentido, não havia sentido no primeiro, não havia sentido no segundo. É apenas uma repetição sem sentido. Quando há um gesto sem sentido teológico, espiritual, então isso é um ritualismo barato, não tem lugar na liturgia”, ensina.
Missa Tridentina
Quando perguntado sobre as iniciativas que promovem o resgate à chamada Missa Tridentina, celebrada entre outras características em latim, dom Edmar recorda que a Igreja ensina, desde Pio X, que a Liturgia é a fonte de nossa vida espiritual. “Ora, para que seja a fonte de nossa vida espiritual, os seus ritos, ou seja, os gestos e as Palavras precisam entrar em mim, na minha vida. Quando eu vejo um rito que eu não entendo o gesto e nem a palavra, eu me pergunto: o que entra na minha vida? O que traz de fruto espiritual aquele gesto e aquela palavra?”, questionou.
Para dom Edmar, o celebrar é a fonte de espiritualidade, e as pessoas devem perguntar-se que fruto recebem ao participar desses ritos, desses gestos e dessas palavras, não apenas recordando a norma, haja vista uma autorização do Papa Bento XVI anos atrás.
Dom Edmar destaca o desejo que as pessoas lessem a coletânea sobre Liturgia de Bento XVI – na Edições CNBB, a obra Teologia da Liturgia – O Fundamento Sacramental da Existência Cristã, tem 752 páginas – não que ficassem “com alguns videozinhos de Youtube de algum gesto de Bento XVI sobre a Liturgia”.
“Leia o Tomo sobre Liturgia de Bento XVI, aí a gente pode falar de Liturgia de Bento XVI, pois se evoca a autoridade dele para fazer coisas que ele jamais iria aprovar, assim como muito evocam a autoridade do Concílio Vaticano II para fazer coisas que jamais o Concílio Vaticano II propôs”, destacou.
Missal Romano
Dom Edmar explicou a importância do Missal Romano para a Igreja: “Existe uma comunhão eclesial que se dá ao redor de um livro. Aquilo que nós celebramos é aquilo que nós cremos. A importância de um livro é que ali está a fé da Igreja”. E comentou as polêmicas causadas por notícias falsas a respeito da tradução da terceira edição pela CNBB. “Nunca, nem o Papa São João Paulo II, que promulgou a 3ª edição do missal romano, nem a Conferência Episcopal dos Bispos do Brasil tem interesse em destruir a fé, porque é o conteúdo da fé que está ali. Quando nós celebramos, nós expressamos o que cremos”, reforçou.
Terceira edição do Missal
A 3ª Edição do Missal Romano foi promulgada por São João Paulo II, após as duas primeiras por São Paulo VI. À época, o Papa Wojtila pediu que todo o missal, e não apenas as partes novas que seriam inseridas na terceira edição, fossem traduzidas.
“Isso gerou para nós no Brasil um trabalho imenso, porque nós não temos pessoas liberadas para fazerem só isso. Então nós tivemos a constituição de peritos que fizeram uma tradução do latim, muito precisa, muito atenta. E depois essa tradução paga a profissionais foi entregue à Cetel. Esses bispos tinham suas dioceses, se reuniam no máximo quatro vezes por ano. Cada parte que era revisada, era conferida no texto em latim, se analisava a poética, a compreensão… era uma fidelidade ao latim, ao povo, ao português, e tudo isso tinha que ser apresentado ainda à Assembleia dos Bispos”, lembrou dom Edmar ao ponderar sobre o longo período para a tradução dos textos.
“A cada ano se pegava o que tinha sido o trabalho, se votava na Assembleia, se começava uma nova etapa. O trabalho agora terminamos. Estamos aproveitando o tempo da pandemia, praticamente todas as semanas nos reunimos às terças-feiras pela manhã via internet para fazer aquela última olhada do que já foi traduzido. E então apresentaremos aos bispos na próxima assembleia o miolo do missal que serão os prefácios, as orações eucarísticas para que eles olhem ponto por ponto das observações que estamos fazendo e, se houve alguma mudança significativa, ela também será apresentada para que os bispos se posicionem”, explicou sobre o processo de aprovação.
“A terceira edição do Missal Romano pega tudo aquilo que os Papas modificaram ou incluíram desde Paulo IV até o Papa Francisco e coloca nessa nova edição. Que é a terceira edição típica”, resumiu dom Edmar sobre as principais alterações que serão encontradas na nova edição do missal.
Confira a entrevista na íntegra:
Fonte: CNBB