A Comissão Regional Pastoral para a Ação Sociotransformadora da CNBB Nordeste 2 divulgou, nesta sexta-feira (25), nota oficial sobre o conflito envolvendo trabalhadores rurais e fazendeiros na Mata Sul de Pernambuco. A mensagem foi apresentada pelo presidente da comissão e bispo auxiliar da Arquidiocese de Olinda e Recife, dom Limacêdo Antonio da Silva, em visita ao Engenho Roncadorzinho, no município de Barreiros (PE).
O religioso, que desde o início acompanha o caso por meio da atuação da Comissão Pastoral da Terra – Nordeste 2 (CPT NE2), esteve no local com o pastor da Igreja Batista Kinno Cerqueira e com o coordenador das Pastorais Sociais da Diocese de Palmares, padre Agivaldo Leão.
Também estiveram na comitiva representando a comissão da CNBB NE2, o articulador, diácono Jaime Bomfim, e a secretária Vivian Santana. Em nome da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Olinda e Recife, estiveram presentes o monge Marcelo Barros e o assessor jurídico, Márcio Tavares; além de membros de pastorais da Igreja Católica e de movimentos sociais.
Leia a nota completa:
CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL
CNBB REGIONAL NORDESTE 2
COMISSÃO REGIONAL PARA A AÇÃO SOCIOTRANSFORMADORA
SETOR PASTORAL SOCIAL“Mãos que derramam sangue inocente…” (Pr 6,17)
Tristeza e perplexidade tomaram nossos corações com a notícia do assassinato do menino Jhonatas Oliveira, de apenas 9 anos, no Engenho Roncadorzinho, em Barreiros, Mata Sul de Pernambuco. Uma criança inocente, cheia de sonhos e com um futuro inteiro pela frente teve sua vida ceifada de maneira fria e covarde, no dia 10 de fevereiro.
As primeiras informações dão conta de que um grupo de homens encapuzados e armados invadiu a casa de Jhonatas e sua família atirando. Os disparos atingiram o pai do menino e líder comunitário, Geovane da Silva Santos, que sobreviveu ao atentado. A criança, ao contrário, foi morta embaixo da cama, onde tentou se esconder dos seus algozes.
A suspeita da família, vizinhos e organizações da sociedade civil é que o crime esteja ligado à disputa pela terra, contrariando as primeiras declarações das forças policiais que alegam que o episódio tem algum vínculo com o tráfico de drogas. No local onde ocorreu a tragédia vivem mais de 400 pessoas desde o decreto de falência da Usina Santo André no ano 2000, que deixou os trabalhadores sem seus direitos garantidos, apenas com o pedaço de chão para subsistência. Infelizmente uma realidade cada vez mais comum num país que se nega a promover justiça social por meio da reforma agrária.
Dois homens foram presos e um foi adolescente apreendido suspeitos de participarem do crime. Mas até agora a sociedade não sabe: Há mandantes? Se sim, quem são eles?
Não podemos encarar a morte de Jhonatas como um caso isolado, correndo o risco de ser esquecido. É notório que o Brasil vive uma escalada de ações violentas como ameaças, destruição de plantações, envenenamento de mananciais de água e até o assassinato de crianças inocentes, que visam aniquilar a parcela mais pobre da população.
A Comissão Regional Pastoral para a Ação Sociotransformadora da CNBB Nordeste 2, primeiramente, reafirma sua solidariedade à família do senhor Geovane e do seu filho Jhonatas e aos demais moradores do Engenho Roncadorzinho. A todos dedicamos nossas orações e apoio solidário neste momento difícil.
À Diocese de Palmares expressamos que seguimos juntos nessa missão em busca da construção do Reino de Deus que requer antes de mais nada a promoção da dignidade humana, sobretudo, dos mais fracos. Assim, portanto, somamo-nos à Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Olinda e Recife, à Comissão Pastoral da Terra da CNBB Nordeste 2, à Fetape, MST e demais entidades da sociedade civil.
Ao Governo de Pernambuco reforçamos o apelo pela celeridade e transparência nas investigações da morte do pequeno Jhonatas, mas não apenas isso, é urgente que junto com os poderes Legislativo e Judiciário saiam da inércia e trabalhem em conjunto para resolver todos os conflitos agrários do Estado, evitando assim que mais sangue inocente seja derramado. Isso requer mais do que palavras e reuniões à mesa, exige de todos nós ação.
A Igreja Católica com sua missão profética em favor dos mais vulneráveis continuará trabalhando para promover a justiça e a paz não apenas em Barreiros (PE), mas em todo território que cabe ao nosso Regional – Alagoas, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte.
Dom Limacêdo Antonio da Silva – Presidente da Comissão Regional Pastoral para a Ação Sociotransformadoras da CNBB NE2
Conselho Pastoral dos Pescadores -Regional Nordeste 2
Pastoral Operária – Regional Nordeste 2
Pastoral da AIDS – Regional Nordeste 2
Pastoral Ambiental – Arquidiocese de Olinda e Recife
Pastoral da Sobriedade – Regional Nordeste 2
Cáritas Regional Nordeste 2
Conselho Nacional de igrejas Cristãs do Brasil – CONIC
Clima de medo
Moradores do Engenho Roncadorzinho relataram ao grupo a sequência de violência que vêm sofrendo de maneira mais intensa desde 2018 como o envenenamento de plantações e fontes de água, uso de cabeças de gado para destruir lavouras, além de ameaças e atentados contra a integridade física e a vida dos trabalhadores.
Este mês, a escalada da violência na região levou à morte de Jhonatas Oliveira, de apenas 9 anos de idade. O menino foi assassinado dentro de casa, após ser invadida por homens encapuzados e fortemente armados. O crime praticado no último dia 10 ainda não foi esclarecido e a família da criança e demais moradores da localidade seguem vivendo sob risco de morte.
Na nota, dom Limacêdo declara que recebeu com “tristeza e perplexidade” a notícia do falecimento do menino, que teve sua “vida ceifada de maneira fria e covarde” e que esse episódio não deve ser tratado como um fato isolado.
“A morte de Jhonatas se tornou um grito em defesa pela vida. Jhonatas não morre, Jhonatas é presente na vida da gente. São cerca de 150 crianças nessa região e elas precisam ter futuro, e o futuro está ligado a terra, que Deus preparou como lugar do seu carinho e do seu amor”, afirmou dom Limacêdo.
O bispo disse aos posseiros do Engenho Roncadorzinho que a visita mostra que o medo será transformado em força para” trabalhar na construção do Reino de Deus”. “Cada um de nós é corresponsável por esse Reino. É importante essa união entre católicos, evangélicos e todas as pessoas para dizer que nossa luta é uma só: a defesa da vida”, declarou o religioso.
Dom Limacedo entregou uma Bíblia ao líder comunitário Geovane da Silva Santos, pai de Jhonatas, que também foi atingido no atentado, mas sobreviveu após ser baleado no ombro. “Que você encontre sempre a luz e a coragem nessa Palavra e nunca perca a fé. Acredito que o seu filho no céu está rezando por nós e cuidando de nós”, disse.