A sua vocação nasceu muito jovem, aos 17 anos, durante uma confissão com um sacerdote que o futuro Pontífice nem conhecia. Era 21 de setembro de 1953, memória litúrgica de São Mateus, o publicano convertido por Jesus, e nesse ato penitencial o jovem Jorge experimenta a misericórdia de Deus. “Depois da confissão”, disse Francisco em 18 de maio de 2013 na Vigília de Pentecostes na Praça São Pedro com movimentos, novas comunidades, associações e agregações de leigos, “senti que algo mudou. Eu não era o mesmo. Tinha ouvido como uma voz, um chamado: estava convencido de que devia ser sacerdote”.
Não é de surpreender que seu lema episcopal e depois pontifício seja precisamente “Miserando atque eligendo” (“Olhou para ele com misericórdia e o escolheu”), ou seja, um trecho de uma homilia de São Beda, o Venerável, que comenta o episódio evangélico da vocação de São Mateus. Em 13 de dezembro de 1969, Jorge Mario Bergoglio foi ordenado sacerdote pelo arcebispo Ramón José Castellano.
O apostolado do “ouvido” e a cura das feridas
O apelo à misericórdia, tema também de um Jubileu especial vivido entre 2015 e 2016, ressoa frequentemente nos discursos de Francisco e nas suas exortações aos sacerdotes: “O sacerdote é um homem de misericórdia e compaixão, próximo do seu povo e servidor de todos”, disse aos párocos de Roma em 6 de março de 2014. “Quem está ferido na própria vida, de qualquer forma, pode encontrar nele atenção e escuta (…) São tantos os feridos, por problemas materiais, por escândalos, até na Igreja. Pessoas feridas pelas ilusões do mundo… Nós, padres, devemos estar ali, perto dessas pessoas. Misericórdia significa curar feridas”, disse o Papa. É sobretudo no confessionário que os sacerdotes podem dispensar a misericórdia de Deus. Por isso, o Papa exortou os confessores a exercerem “o apostolado do ouvido”, não a estarem “com o chicote na mão”, mas a “receber, ouvir e dizer que Deus é bom e que Deus sempre perdoa, que Deus nunca se cansa de perdoar” (Angelus, 14 de fevereiro de 2021).
Oração, Palavra e Pão
Arraigado na oração e na caridade, nunca desligado dos fiéis, nunca um mero funcionário, mas uma pessoa despojada de si mesmo e desprovida de “ideias pré-constituídas”, o sacerdote é “um homem de Deus 24 horas por dia, não um homem do sagrado quando usa os paramentos”. Em 15 de setembro de 2018, em Palermo, durante o encontro com o clero, religiosos e seminaristas, o Papa enfatizou que para o presbítero “a liturgia deve ser vida, não permanecer rito”. Por isso, é fundamental rezar a Ele de quem falamos, alimentar-nos da Palavra que pregamos, adorar o Pão que consagramos, e fazê-lo todos os dias. Oração, Palavra e Pão, essenciais para cada sacerdote todos os dias, essenciais para todos os consagrados e consagradas todos os dias.
Olhar além para reconhecer Deus
Nas palavras de Francisco, todo sacerdote deve ser também um sonhador, como São José: “Não ‘sonhador’ no sentido de quem tem a cabeça nas nuvens, desligado da realidade”, explicou à Comunidade do Pontifício Colégio Belga, recebida em audiência a 18 de março de 202, “mas um homem que sabe olhar para além do que vê: com um olhar profético, capaz de reconhecer o desígnio de Deus onde os outros nada veem e, portanto, com um objetivo claro pelo qual se empenhar”. Na prática, os sacerdotes devem “saber sonhar a comunidade que ama, não se limitar a querer preservar o que existe, conservar e proteger não são sinônimos! Estarem antes dispostos a partir da história concreta das pessoas para promover a conversão e a renovação no sentido missionário e para fazer crescer uma comunidade em caminho, composta por discípulos guiados pelo Espírito e movidos pelo amor de Deus”. Os sacerdotes, reiterou o Pontífice, não devem ser “super-homens com sonhos de grandeza”, mas “pastores com cheiro das ovelhas”, isto é, capazes de sonhar “uma Igreja inteira a serviço” e “um mundo mais fraterno e solidário”, abandonando a “autoafirmação” para colocar “Deus e as pessoas” no centro da vida.
Transmitir esperança aos corações inquietos
“O sacerdote é um homem que, à luz do Evangelho, difunde o gosto de Deus ao seu redor e transmite esperança aos corações inquietos”, acrescentou Francisco. Uma esperança que vem acompanhada de um sorriso, aquele que vem da alegria do Evangelho: só junto com o Senhor, de fato, os sacerdotes podem ser “apóstolos da alegria, cultivando a gratidão de estar a serviço dos irmãos e da Igreja”. A alegria indicada pelo Pontífice se difunde também pelo senso de humor: “Um sacerdote que não tem senso de humor, ninguém gosta, algo está errado”, disse ele em 7 de junho de 2021, encontrando-se com a comunidade do Colégio de São Luís dos Franceses em Roma. “Esses grandes sacerdotes que riem dos outros, de si mesmos e até da própria sombra: o senso de humor é uma das características da santidade.” Ele, “te levanta, te faz ver o provisório da vida e tomar as coisas com o espírito de uma alma redimida. É uma atitude humana, mas é a que mais se aproxima da graça de Deus” (Entrevista com a TV2000 e RadioInBlu, novembro de 2016).
A poderosa arma da gratidão
Por fim, Francisco convidou frequentemente os sacerdotes ao exercício da gratidão e do agradecimento: “A gratidão é sempre ‘uma arma poderosa’”, escreve ele em sua Carta aos Sacerdotes por ocasião dos 160 anos da morte do Santo Cura d’Ars. “Somente se formos capazes de contemplar e agradecer concretamente por todos os gestos de amor, generosidade, solidariedade e confiança, assim como perdão, paciência, suportação e compaixão com os quais fomos tratados, permitiremos que o Espírito nos dê aquele ar fresco capaz de renovar, e não remendar, a nossa vida e missão”, mantendo acesa “a chama da esperança”.
Fonte: CNBB com VaticaNews