A Igreja, mãe e mestra, também é especialista no intercâmbio de cuidado. A Campanha da Fraternidade deste ano ressaltou esta missão e vocação para salvaguardar e promover o dom da vida. No Brasil inteiro, centenas de casas pró-vida dão o exemplo deste cuidado, trabalhando para salvar gestantes em situação de vulnerabilidade e bebês que correm o risco de serem abortados.
“Muitas vezes, a gravidez chega num momento não esperado ou planejado pelo casal ou às vezes até em condições ainda piores, quando é o caso de uma relação forçada, mas, mesmo nesses casos extremos, a vida que está sendo gestada no ventre da mãe merece respeito porque toda vida é dom de Deus”, afirma o casal coordenador da Pastoral Familiar, Luiz e Kátia Stolf, que participam da Comissão de Promoção e Defesa da Vida na diocese de Joinville (SC).
Vulnerabilidade
As casas pró-vida acolhem gestantes em situação de vulnerabilidade social, muitas delas, de acordo com Luiz e Kátia, são pressionadas pelo pai, pela família e a própria sociedade para que abortem e, “como dizem, ‘resolva o problema’”.
“Para quem está olhando de fora, é exatamente isso que acontece, o aborto resolveu algo que o incomodava, porém, a mãe, a partir dessa decisão, passa a enfrentar sérios problemas, sejam eles de ordem física, psíquica, emocional e espiritual”, situam.
A Igreja oferece em algumas paróquias acompanhamentos para orientar as mães de como proceder diante dessa situação de dúvida e desespero e, quando houver a disposição, essas mães podem ser encaminhadas para casas especializadas no acolhimento de mães gestantes em situação de vulnerabilidade social, são as chamadas casas pró-vida.
Luiz e Kátia também explicam que a Igreja tem normalmente grande proximidade e articulação com as casas pró-vida, onde sua participação se torna muito importante no sentido de levar conforto espiritual e ministrar os sacramentos, quando necessário.
Espaço de acolhida
“A grande maioria das mães que buscam essa ajuda ou que são abordadas estão em situação de desespero e por isso desenvolvem um forte desejo de abortar, porém, ao serem acolhidas e receberem a oferta de um acompanhamento digno para elas e para o bebê, normalmente desistem do aborto e assim muitas vidas são salvas”, contam Luiz e Kátia.
As casas pró-vida, muitas delas ligadas à Igreja e administradas por fiéis leigos ou congregações religiosas, também lidam com casos de mães que sofreram com o estupro e que puderam evitar o aborto. Em visitas a estas casas, o bispo de Rio Grande (RS) e presidente da Comssão Episcopal para a Vida e a Família da CNBB, dom Ricardo Hoepers, pôde ver as crianças que sobreviveram a partir do caminho de superação de suas mães: “Eu as conheci, conheci as mães, conheci suas histórias e no brilho de seus olhos a alegria de superarem o trauma do abuso com suas crianças no colo. São crianças que não podem ser culpadas pelo mal que não fizeram”.
Em outros casos, quando não é possível para a mãe continuar com a criança, o que segue é normalmente a adoção do bebê, já com trâmites jurídicos bem definidos. “As casas pró-vida têm toda uma equipe multidisciplinar com profissionais da saúde e outros que dão todo apoio necessário às famílias que decidem não abortar”, conta dom Ricardo.
Luiz e Kátia explicam que, quando a mãe mantém o firme propósito de doar o bebê, a assistente social da casa comunica à assistente social da maternidade. Esta, por sua vez, encaminha o processo junto ao fórum local para os devidos procedimentos.
Milhares de crianças salvas
Em São José dos Campos (SP) está a Associação Guadalupe, que funciona há sete anos e contabiliza mais de 5 mil crianças salvas do aborto, tanto com atendimentos presenciais, quanto por telefone para outras partes do país.
Mariângela Cônsoli, assistente social fundadora e presidente da Associação Guadalupe, fala que o trabalho nasceu de uma inspiração a partir de Nossa Senhora “para defender a vida do bebê que está para ser exterminado, como também a vida dessa mãe”.
“Nós atendemos, acolhemos e oferecemos apoio total: social, psicológico, jurídico, espiritual, material, financeiro muitas vezes”, conta Mariângela. No local, são realizadas oficinas de empreendedorismo, dando condições para que as mães possam dar continuidade à sua gestação com tranquilidade, “tendo a certeza que ela terá apoio financeiro por ela mesma lá na frente”, conta a presidente da associação.
A casa atende cerca de 40 mulheres presencialmente e chega a cem atendimentos por telefone. Este apoio remoto é realizado pela médica ginecologista e obstetra Marilene Macull Melo, vice-presidente da Associação Guadalupe. Em 10 anos de trabalho na defesa da vida, a médica observa que ninguém quer abortar porque quer: “normalmente ela se vê dentro de uma condição que ela não vê saída”, mas a situação muda quando a mãe compreende o risco que ela corre, tanto do aspecto médico, de saúde, psicológico, emocional e até psiquiátrico.
A associação conta com 70 voluntários e se mantém através de doações. Entre o grupo de pessoas que colaboram no trabalho, há um grupo de intercessão, que promove momentos de oração, meditação do terço e missas. “Trabalhar em defesa da vida sem oração é impossível. Há uma necessidade vital de nos apoiarmos na oração”, afirma Mariângela.
No Distrito Federal, foi inaugurado, em março um novo espaço para acolhimento, assistência psicológica e promoção humana fruto da providência divina e da solidariedade. O Centro de Referência de Defesa da Vida inaugurado pela Associação Santos Inocentes, em Samambaia, região administrativa do DF, busca oferecer alternativas às mulheres que pensam em praticar o aborto.
“Nosso trabalho começa com o convencimento, mas não adianta convencer se você não tem nada a oferecer para estas mulheres que já vem de uma miséria humana muito grande, de uma necessidade muito grande de serem entendidas e acolhidas no momento em que elas estão gestantes e sozinhas. Esse é o papel da Santos e Inocentes”, afirmou um dos fundadores da obra e presidente da Associação, Areolino Dias França.
Uma das fundadoras da associação brasiliense, Lucimar Rodrigues Nunes, ressaltou que o primeiro serviço oferecido pela instituição é a defesa da vida: “salvar as crianças e as mães do mal do aborto”, a partir daí as ofertas de pediatria, psicologia adulta e infantil, serviço social e atendimento odontológico.
“As nossas mães são muito importantes. Nós fazemos tudo o que está ao nosso alcance para ela ter essa rede de proteção, que é buscar para elas tudo aquilo que ela tem direito via governamental, como atendimento hospitalar, moradia, de tudo aquilo que é uma necessidade e que a realidade delas não oferecia”, conta Lucimar.
Modalidades de atendimento
Luiz e Kátia Stolf contam que as casas pró-vida que acolhem as gestantes normalmente trabalham no regime de internato ou de acolhida durante o dia. “As casas pró-vida que acolhem pelo regime de internato dispõe de espaços para acolher as mães com privacidade e devido conforto, onde recebem atendimento e acompanhamento com psicólogos e assistente social. Já nas casas onde não há o regime de internato, mas o acolhimento durante o dia, as mães frequentam a casa durante todo o período de gestação onde elas aprendem a fazer trabalhos manuais, como preparar o próprio enxoval do bebê, recebem formação sobre empreendedorismo, culinária e outras atividades”, explicam.
As mães são atendidas e acompanhadas por psicólogos, terapeutas e outros profissionais, uma vez que muitas delas chegam às casas com sua baixa autoestima e sem o desejo de dar prosseguimento à gestação, por não aceitar o bebê. “Nesses casos é realizado um trabalho específico de interação entre a atividade que ela realiza e o bebê, o qual ela passa aos poucos a aceitar e amar”, conta Kátia Stolf.
Nos dois modos de atendimento/acolhimento, as mães são acompanhadas e levadas a realizar todos os exames necessários como o pré-natal. Quando é chegado o momento do parto, a mãe é acompanhada até a maternidade. Após o parto elas continuam sendo acompanhadas e assistidas juntamente com o filho durante vários meses.
“Muitas das mães, ao chegarem à casa pró-vida, expressam o desejo de doar seu filho quando o mesmo nascer, porém, a grande maioria delas ao ver seu filho recém-nascido acabam desistindo de doar”, afirma Kátia.
Apoio da Igreja
A proximidade e a articulação da Igreja com as casas pró-vida se dão de várias formas, desde o auxílio na sustentabilidade, quanto no atendimento pastoral. Como estas casas normalmente não recebem ajuda dos órgãos públicos, o que torna difícil sua manutenção e continuidade dos trabalhos, ajudas e doações da comunidade e de voluntários ligados à Igreja tornam possível a continuidade da missão.
A Associação Guadalupe é reconhecida oficialmente como uma Obra Social Pró-vida da diocese de São José dos Campos. Várias iniciativas são realizadas para auxiliar na manutenção do trabalho. Atualmente, a entidade está arrecadando alimentos, produtos de higiene e limpeza e ajuda financeira. As doações podem ser entregues na Nossa Sede na Av. Princesa Isabel, 1235, Santana – S. J. dos Campos (SP), de segunda a sexta-feira, das 14h às 17h, ou depósito em conta: Banco Itaú | CC:14.166-8 | AG: 8602 | CNPJ: 20.149.598/0001-92.
Em Brasília, o Centro de Referência da Associação Santos Inocentes foi construído graças a articulação do Padre Luiz Gustavo de Araújo, pároco da paróquia Imaculado Coração de Maria, numa região administrativa e maior poder aquisitivo. O presbítero envolveu a comunidade paroquial pedindo doações e mobilizando ajudas, como a do engenheiro Marcos Vieira, que acreditou na “loucura” de Areolino com o projeto de construção e colaborou doando seus conhecimentos profissionais. O sacerdote abençoou o local e disse aos missionários leigos que “quem salva uma alma tem a sua salva”, recordando a luta contra o aborto.