Tempo Pascal: tempo eterno de misericórdia

Dom Jaime Vieira Rocha
Arcebispo de Natal

Queridos irmãos e irmãs,

A experiencia de isolamento social, em muitos aspectos, sofrido, vivido com sacrifício, mas com um ingrediente de criatividade, como oportunidade de revisão de vida, de hábitos, de costumes, também traz para nós, cristãos e cristãs, um tempo de reflexão, sempre com atenção harmoniosa entre o porquê disso tudo e o que devemos fazer, especialmente no tocante aos apelos da natureza, ao reconhecimento de nossa parcela de responsabilidade diante dos estragos cometidos pelas nossas ações, da prudência no julgamento e, sobretudo, na tomada de consciência de que devemos agir de outra forma, viver com propósitos que levam ao cuidado da Casa Comum, mas sem esquecer que a nossa missão é anunciar aos homens e às mulheres o Evangelho da Graça misericordiosa de nosso Deus, manifestada em Jesus Cristo.

Para nós, esse tempo está unido ao novo tempo litúrgico na Igreja, o Tempo Pascal, onde somos exortados a renovar nossa alegria e nossa convicção de fé. O Tempo Pascal, 50 dias da Ressurreição de Jesus até a festa de Pentecostes, não é mais um tempo litúrgico na Igreja. Ele é o tempo que, inaugurado pela glorificação do Filho de Deus feito homem, torna-se o tempo final, conclusivo, a plenitude dos tempos. Devemos levar a sério a ação de Deus que, ao ressuscitar o seu Filho realiza a nova criação. Fazemos patê dessa nova criação. Estamos conscientes disso? A Ressurreição de Jesus significa que Deus operou, derramou e encheu o mundo com sua misericórdia. Misericórdia não é um sentimento qualquer, uma fraqueza do ser. Ela significa que Deus, com seu coração, aproxima-se do homem pecador, do mísero: “ter o próprio coração (cor) próximo aos pobres (miseri), ter um coração para os pobres”. É o que a palavra “misericórdia” significa em latim. Alguém já disse que a “misericórdia é o conceito fundamental do Evangelho, conceito chave da vida cristã” (Walter Kasper).

Podemos nos perguntar: isso é realidade em nossa vida cotidiana? Temos misericórdia em nossas ações? O nosso coração é próximo dos pobres, dos homens e das mulheres? A Páscoa que celebramos renova nossa ação pastoral? Creio dever exortar a todos os fiéis, padres, diáconos e leigos: somente agindo com misericórdia é que nós podemos imitar Jesus. A nossa missão no mundo é mostrar o nosso coração próximo dos que sofrem, pois, o coração de Deus se fez próximo de todos nós, com a Ressurreição de Jesus.

Quando temos misericórdia levamos a sério a redenção realizada por Jesus Cristo, por mandato do Pai e na força do Espírito Santo. Essa aproximação do coração de Deus ao nosso coração foi a experiência que os apóstolos e discípulos tiveram com as aparições do Ressuscitado. Ela é uma aproximação concreta, pois, apresenta-se com elementos, sinais e gestos que acompanham a nossa caminhada de fé: a Palavra de Deus, ouvida, refletida e aclamada em nossas celebrações; a Eucaristia, sinal sacramental de que Jesus está no meio de nós; a valorização da pessoa humana na sua dignidade; o não uso da pessoa para fins de comércio, de meda de troca; a presença alegre e amorosa do Espírito Santo em nossa vida, em nosso ser, dando-nos a paz; a formação na fé, tão necessária hoje, para que a nossa resposta seja coerente, racional e, sobretudo, não venha a se tornar “ópio” para o povo. Jamais a Igreja pode trair o Evangelho.

Jamais a Igreja pode substituir a adoração ao seu único Senhor, adorando ou venerando o que se apresenta como contrário ao projeto de Jesus Cristo. Jamais a Igreja pode esquecer que o Reino de Deus é superior a qualquer futuro intramundano, mesmo que ele seja maquiado de um messianismo político que tenha realizado felicidade terrena.

Procuremos sempre fazer audível e concreto este nosso anúncio: com a Ressurreição de Jesus, Deus inaugura o tempo da misericórdia, tempo de salvação, tempo em que a Igreja se alimenta e se renova sempre. E só Ele nos dá essa salvação. Só ele é o Messias de Deus para nós.

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