Nota da Pastoral Carcerária sobre massacre em Altamira (PA)

Por CNBB

Nesta segunda-feira (29), pelo menos 58 pessoas foram mortas no Centro de Recuperação Regional de Altamira, no Pará. Mais quatro presos, que haviam sobrevivido, foram assassinados durante a transferência de Altamira para Marabá, totalizando, até o momento, 62 mortes.

Diante de mais um episódio de mortes no sistema carcerário, ocorrido dois meses após os massacres em Manaus, a Pastoral Carcerária Nacional vem a público se posicionar e afirmar, mais uma vez, que esses episódios de mortes massivas não são casos isolados: são consequências diretas do funcionamento do sistema prisional.

Confira a nota na íntegra:

Diante de um dos maiores massacres ocorridos no sistema prisional, que tirou a vida de 62 presos, a Pastoral Carcerária se posiciona na nota abaixo. Para baixar a nota, clique aqui:

“As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo”.

(Constituição Pastoral – Gaudium Et Spes)

Nesta segunda-feira (29), pelo menos 58 pessoas foram mortas no Centro de Recuperação Regional de Altamira, no Pará. Mais quatro presos, que haviam sobrevivido, foram assassinados durante a transferência de Altamira para Marabá, totalizando, até o momento, 62 mortes.

Diante de mais um episódio de mortes no sistema carcerário, ocorrido dois meses após os massacres em Manaus, a Pastoral Carcerária Nacional vem a público se posicionar e afirmar, mais uma vez, que esses episódios de mortes massivas não são casos isolados: são consequências diretas do funcionamento do sistema prisional.

Após o massacre, a Superintendência do Sistema Penitenciário do Pará (Susipe) expôs a versão oficial de que a tragédia teria sido resultado de um ataque de uma facção à outra. Essa narrativa afasta a responsabilidade do Estado sobre as mortes, que são consequência inevitável do sistema prisional, cujo funcionamento leva a produção de dor e sofrimento, como afirmamos em nota pública acerca do recente massacre ocorrido em Manaus[1]

A tentativa de retirar o Estado dessa equação também serve para tornar um fato tão estarrecedor quanto a morte de 62 pessoas em um acontecimento banal, como fez o presidente da república quando questionado sobre o ocorrido[2].

Os fatores que levaram ao massacre desta semana não são naturais. Altamira, antes da construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, era uma cidade com baixos índices de violência. A chegada das empreiteiras na cidade, no entanto, somado ao aumento vertiginoso da população por conta da obra, mudou a cidade por completo.

No ano 2000, a cidade registrava apenas oito homicídios e média de 9,1 mortes por 100 mil habitantes. Em 2015, e após a construção da usina, Altamira era cidade mais violenta de todo o Brasil[3].

O consórcio Norte Energia, responsável pela construção de Belo Monte, está custeando um novo complexo prisional na cidade, como “uma das contrapartidas pela construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte em Altamira”[4]. Ou seja, o consórcio responsável por tornar Altamira a cidade mais violenta do país financia a construção de um complexo prisional que vai, como todas as outras prisões, servir para descartar essas vidas tidas como indesejáveis e marginalizadas.

Essa também não é a primeira vez que ocorrem mortes no sistema carcerário de Altamira. Em setembro de 2018, uma rebelião deixou sete mortos. Os presos reivindicavam celeridade processual e melhoria das condições de aprisionamento[5]. Em outubro do mesmo ano, houve fuga no Centro de Recuperação de Altamira[6].

O Centro de Recuperação Regional de Altamira é uma unidade superlotada. Com capacidade para 163 presos, comportava 343. Relatório divulgado nesta segunda-feira pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) classifica as condições do presídio de Altamira como “péssimas”.

A Susipe também alegou que não tinha como saber que o massacre iria ocorrer, mas uma notícia no próprio site da Superintendência mostra que, no dia 20 de maio deste ano,

familiares fizeram um protesto em frente à porta do órgão, pedindo a transferência de presos desta unidade, evidenciando a preocupação das famílias com a garantia da vida de seus entes queridos.[7]

A Susipe afirmou que estaria “acompanhando em tempo real todo o movimento da massa carcerária”. Desse dito acompanhamento refletiu-se o maior saldo de mortos dentro de um presídio na história do estado do Pará.

Mais uma vez, a solução requentada de abertura de novas vagas é apresentada pelo Estado, reforçando um ciclo infindável de construção de presídios e aumento da violência.

No entanto, tal medida em nada combate os efeitos mortíferos da política de encarceramento em massa, nem reduz a violência. Como afirmamos desde os massacres ocorridos em 2017 em Manaus, Roraima e Rio Grande do  Norte, não se trata de uma crise no sistema prisional, e sim de um projeto, que está se intensificando. Isto é, a máquina de moer gente está em pleno funcionamento[8].

Os ataques no Ceará no início do ano, o massacre em Manaus e as dezenas de mortes em Altamira, além das torturas e mortes diárias nas celas pelo país, são resultados desse projeto.

Se guardamos qualquer resquício de humanidade, a reversão do processo de encarceramento em massa é urgente. À luz da campanha da fraternidade de 2019, reforçamos nosso compromisso com a busca por políticas de desencarceramento.

A Pastoral Carcerária Nacional se solidariza com todas as vítimas, com os presos de Altamira e com seus familiares, e, enquanto massacres, mortes e torturas continuarem ocorrendo atrás das grades, estaremos denunciando e lutando contra o sistema prisional.

Pastoral Carcerária Nacional
Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Sociotransformadora/CNBB

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